Lição 3
09 a 15 de abril
Caim e seu legado
Sábado à tarde
Ano Bíblico: 2Sm 22-24
Verso para memorizar: “Se fizer o que é certo, não é verdade que você será aceito? Mas, se não fizer o que é certo, eis que o pecado está à porta, à sua espera. O desejo dele será contra você, mas é necessário que você o domine” (Gn 4:7).
Leituras da semana: Gn 4; Hb 11:4; Mq 6:7; Is 1:11; 1Co 10:13; 1Jo 3:12; Gn 5; 6:1-5

Em Gênesis, o que se segue imediatamente após a queda, e a expulsão de Adão e Eva do Éden, são nascimentos e mortes, todos em cumprimento das profecias de Deus no capítulo anterior. Gênesis 3 e 4 contêm muitos temas e palavras comuns: descrições de pecado (Gn 3:6-8; 4:8), maldições da terra [‘adamah] (Gn 3:17; 4:11) e expulsão (Gn 3:24; 4:12, 16).

A razão desses paralelos é destacar o cumprimento das profecias e predições que Deus fez a Adão e Eva após a queda. O primeiro evento depois de Adão ter sido expulso foi cheio de esperança: o nascimento do primeiro filho, considerado por Eva como o cumprimento da promessa que ouviu na profecia messiânica (Gn 3:15). Ou seja, ela pensou que ele fosse o Messias prometido.

Os eventos seguintes: o crime de Caim, o crime de Lameque, a diminuição da expectativa de vida e o aumento da maldade são todos cumprimentos da maldição proferida em Gênesis 3.

No entanto, nem toda esperança estava perdida.

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Domingo, 10 de abril
Ano Bíblico: 1Rs 1, 2
Caim e Abel

1. Leia Gênesis 4:1, 2. O que aprendemos sobre o nascimento de Caim e Abel?

O primeiro evento registrado pelo autor bíblico imediatamente após a expulsão de Adão do jardim do Éden é um nascimento. Na frase hebraica em Gênesis 4:1, as palavras “o Senhor” (YHWH) estão diretamente ligadas às palavras “um homem”, como indica a seguinte tradução literal: “Adquiri um homem, na verdade o próprio Senhor”. Essa tradução sugere que Eva se lembrou da profecia messiânica de Gênesis 3:15 e acreditou que havia dado à luz seu Salvador, o Senhor. “A vinda do Salvador foi predita no Éden. Depois que Adão e Eva ouviram pela primeira vez a promessa, aguardaram um cumprimento imediato dela. Receberam alegremente seu primeiro filho, na esperança de que fosse o Libertador” (Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 20 [31]).

Caim ocupa a maior parte do relato. Ele não era apenas o primogênito, um filho que os pais quase “adoravam”; no capítulo, ele é o único que fala. Enquanto Eva comentou animadamente sobre o nascimento de Caim, não disse nada no nascimento de Abel, pelo menos nada que esteja registrado no texto, em contraste com o nascimento de Caim. O narrador simplesmente relatou que ela “voltou a dar à luz” (Gn 4:2, NVI).

O nome Caim vem do verbo hebraico qanah, que significa “adquirir” e denota a aquisição, a posse de algo precioso e poderoso. Por outro lado, o nome hebraico Hebel, em português Abel, significa “sopro” (Sl 62:9, NVI), ou “brisa” (Sl 144:4, NVT), e indica algo evasivo, vazio, falta de substância. A mesma palavra, hebel (abel), é usada repetidamente em Eclesiastes para “vaidade”. Embora não seja nossa intenção ver mais nessas curtas passagens do que aquilo que está contido nelas, talvez a ideia seja de que a esperança de Adão e Eva repousasse somente em Caim, pois acreditavam que ele, e não seu irmão, fosse o Messias prometido.

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Que coisas na vida são verdadeiramente hebel (“vaidade”), mas que tratamos como se fossem mais valiosas do que de fato são? Por que devemos saber a diferença entre o que é importante e o que não é?


Segunda-feira, 11 de abril
Ano Bíblico: 1Rs 3, 4
As duas ofertas

O contraste entre Caim e Abel, conforme refletido em seus nomes, não dizia respeito apenas às suas personalidades; também se manifestava em suas respectivas ocupações. Enquanto Caim era “agricultor”, profissão que exigia trabalho físico árduo, Abel era “pastor de ovelhas” (Gn 4:2), o que implicava sensibilidade e compaixão.

Essas duas ocupações não apenas explicam a natureza das duas ofertas (alimentos de Caim e uma ovelha de Abel), mas também falam das duas atitudes psicológicas e mentalidades diferentes associadas a elas: Caim trabalhava para “adquirir” o fruto que produzia, enquanto Abel tinha o cuidado de “guardar” as ovelhas que recebia.

2. Leia Gênesis 4:1-5 e Hebreus 11:4. Por que Deus aceitou a oferta de Abel e rejeitou a de Caim? Como devemos entender o que aconteceu ali?

“Sem derramamento de sangue não poderia haver remissão de pecado; e eles deviam mostrar sua fé no sangue de Cristo como a expiação prometida, oferecendo em sacrifício o primogênito do rebanho. Além disso, as primícias da terra deviam ser apresentadas diante do Senhor em ação de graças” (Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 47 [71]).

Enquanto Abel obedeceu às instruções divinas e, conforme o texto hebraico, ofereceu as primícias da terra, além da oferta queimada de animal, Caim se recusou a fazê-lo. Ele não trouxe um animal para ser sacrificado, mas apenas uma oferta do “fruto da terra”. Foi um ato de flagrante desobediência, em contraste com a atitude de seu irmão. Com frequência, essa história tem sido considerada um caso clássico de salvação pela fé (Abel e sua oferta de sangue) em contraste com uma tentativa de ganhar a salvação pelas obras (Caim e o fruto da terra).

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Embora essas ofertas devessem ter um significado espiritual, não tinham valor mágico em si mesmas. Sempre foram meros símbolos, imagens que apontavam para o Deus que provê ao pecador não apenas o sustento, mas também a redenção (Mq 6:7; Is 1:11). Como aplicar o princípio contido nesses textos em nossa vida e adoração?


Terça-feira, 12 de abril
Ano Bíblico: 1Rs 5, 6
O crime

3. Leia Gênesis 4:3-8. O que levou Caim a matar seu irmão? Veja também 1 João 3:12.

A reação de Caim foi dupla: “Caim ficou muito irritado e fechou a cara” (Gn 4:5). Ao que parece, a raiva de Caim foi dirigida a Deus e a Abel. Ele sentiu raiva de Deus porque pensava que estava sendo vítima de injustiça, e raiva de Abel porque tinha ciúmes de seu irmão. Ciúmes de quê? Devido à oferta? É evidente que algo mais aconteceu nos bastidores e que não é revelado nesses poucos textos. Caim entristeceu-se, pois sua oferta não havia sido aceita.

As duas perguntas de Deus em Gênesis 4:6 estão relacionadas às duas condições de Caim. Observe que o Senhor não o acusou. Da mesma forma que fez com Adão, Deus fez perguntas, não porque não soubesse as respostas, mas porque desejava que Caim olhasse para si mesmo e entendesse a razão de sua própria condição. Como sempre, o Senhor procura redimir Seu povo, mesmo quando este O abandona abertamente. Então, depois de perguntar, Deus aconselhou Caim.

Primeiro, o exortou a “fazer o bem”. Foi um chamado ao arrependimento e à mudança de atitude. Deus prometeu a Caim que ele seria “aceito” e perdoado; mas isso deveria acontecer nos termos Dele, não nos de Caim.

Por outro lado, “se não fizer o que é certo, eis que o pecado está à porta, à sua espera. O desejo dele será contra você, mas é necessário que você o domine” (Gn 4:7). O conselho divino revelou a raiz do pecado e esta se encontrava no próprio Caim. Novamente, Deus o aconselhou, procurando guiá-lo no caminho que devia seguir.

O segundo conselho divino diz respeito à atitude que se deveria tomar em relação àquele pecado, que estava à porta e cujo desejo era contra Caim. Deus recomendou autocontrole: “é necessário que você o domine”. O mesmo princípio ecoa em Tiago: “cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz” (Tg 1:14). O evangelho oferece não só o perdão, mas também a vitória sobre o pecado (1Co 10:13). Caim não tinha ninguém para culpar por seu pecado, exceto a si mesmo. Em geral, não é isso também o que acontece a todos nós?

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O que essa história triste ensina sobre o livre-arbítrio e sobre o fato de que Deus não nos força a obedecer?


Quarta-feira, 13 de abril
Ano Bíblico: 1Rs 7, 8
A punição de Caim

4. Leia Gênesis 4:9-16. Por que Deus perguntou: “Onde está Abel, o seu irmão?” Qual é a relação entre o pecado de Caim e o fato de se tornar “fugitivo e errante pela terra” (Gn 4:12)?

A pergunta de Deus a Caim relembra a pergunta feita pelo Senhor a Adão no Éden: "Onde você está?"

Caim, porém, não reconheceu seu pecado. Ao contrário, o negou, algo que Adão não fez, embora tentasse colocar a culpa em outro. Caim, por sua vez, desafiou abertamente a Deus, que não perdeu tempo confrontando-o com seu crime. Quando o Senhor fez a terceira pergunta “O que foi que você fez?”, Ele nem mesmo esperou por uma resposta, apenas relembrou a Caim que sabia de tudo, pois a voz do sangue de Abel O alcançava desde a terra (Gn 4:10), imagem que significava que Deus sabia sobre o assassinato e reagiria. Abel havia voltado à terra, estava enterrado, uma ligação direta com a queda e com o que o Senhor disse que aconteceria a Adão (ver Gn 3:19).

5. Leia Gênesis 4:14. O que significam as palavras de Caim: “da Tua presença terei de me esconder”?

O sangue de Abel tinha sido derramado na terra. Por isso, ela foi amaldiçoada novamente (Gn 4:12). Como resultado, Caim foi condenado a se tornar um refugiado, longe do Senhor. Somente quando Caim ouviu a sentença divina, reconheceu o significado da presença de Deus, pois sem Ele, temeu por sua própria vida. Mesmo após ter assassinado a sangue frio seu irmão e ter se rebelado, o Senhor mostrou misericórdia para com ele, e ainda que Caim tenha se retirado “da presença do Senhor” (Gn 4:16), Ele lhe deu algum tipo de proteção. Não sabemos o que exatamente era esse “sinal” (Gn 4:15), mas foi dado apenas por causa da graça de Deus para com ele.

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“Da Tua presença serei escondido” (Gn 4:14, TB). É possível se esconder da presença de Deus? Que situação trágica. Sendo pecadores, qual é a única maneira de evitar essa situação?


Quinta-feira, 14 de abril
Ano Bíblico: 1Rs 9, 10
A maldade do ser humano

6. Leia Gênesis 4:17-24. Qual foi o legado de Caim, e como seu crime abriu caminho para o aumento da impiedade?

Lameque, descendente de Caim, referiu-se ao crime do avô no contexto do seu próprio. Essa comparação entre o crime de Caim e o de Lameque é instrutiva. Enquanto o primeiro se calou sobre seu único crime registrado, o segundo parecia se vangloriar do seu, expressando-o em uma canção (Gn 4:23, 24). Enquanto Caim pediu a misericórdia divina, não háregistro de Lameque fazendo o mesmo. Enquanto Caim foi vingado sete vezes por Deus, Lameque acreditava que seria vingado setenta e sete vezes (ver Gn 4:24), uma indicação de que ele estava bem ciente de sua culpa.

Além disso, Caim era monogâmico (Gn 4:17). Lameque introduziu a poligamia, pois a Bíblia diz especificamente que ele “tomou para si duas esposas” (Gn 4:19). Essa intensificação e exaltação do mal afetaram as gerações seguintes de caimitas.

O texto bíblico registra um novo evento que se opõe a essa tendência. “Adão tornou a ter relações com sua mulher” (Gn 4:25), e o resultado foi o nascimento de Sete, cujo nome foi dado por Eva para indicar que Deus lhe havia concedido “outro descendente” no lugar de Abel.

A história do nome Sete precede Abel. Ele deriva do verbo hebraico ‘ashit, “porei” (Gn 3:15), que introduz a profecia messiânica. A semente messiânica seria transmitida na linhagem setita. A Bíblia começa o registro da linhagem messiânica com Sete, inclui Enoque e Metusalém e termina com Noé (Gn 5:3, 24, 25; 6:8).

A frase “os filhos de Deus” (Gn 6:2) refere-se à linhagem de Sete, pois foram concebidos para preservar a imagem divina (Gn 5:1, 4). Por outro lado, as “filhas dos homens” (Gn 6:2) parecem ter uma conotação negativa, contrastando a descendência daqueles que são imagem de Deus com aqueles que são feitos à imagem dos homens. E foi sob a influência dessas “filhas dos homens” que os filhos de Deus “tomaram para si mulheres, aquelas que, entre todas, mais lhes agradaram” (Gn 6:2), indicando a direção errada que a humanidade estava tomando.

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Gênesis 6:1-5 traz um testemunho poderoso da corrupção do pecado. Por que devemos fazer tudo o que pudermos no poder de Deus para erradicar o pecado de nossa vida?


Sexta-feira, 15 de abril
Ano Bíblico: 1Rs 11, 12
Estudo adicional

A frase “Enoque andou com Deus” (Gn 5:22, 24) significa companheirismo íntimo e diário com o Senhor. O relacionamento pessoal de Enoque com Deus era tão especial que “Deus o levou” (Gn 5:24). Essa última frase é única na genealogia de Adão e não apoia a ideia de vida após a morte para aqueles que “andam com Deus”. Observe que Noé também andou com Deus (Gn 6:9) e morreu como todos os outros, incluindo Adão e Metusalém. Também é interessante notar que nenhuma razão é dada para justificar essa graça especial. “Enoque se tornou um pregador da justiça, tornando conhecido ao povo o que Deus lhe revelara. Aqueles que temiam ao Senhor procuravam esse santo homem, para compartilharem de sua instrução e de suas orações. Enoque trabalhava também publicamente, apregoando a mensagem de Deus a todos os que desejavam ouvir as palavras de advertência. Seus labores não se restringiam aos descendentes de Sete. Na terra em que Caim procurara fugir da presença divina, o profeta de Deus tornou conhecidas as maravilhosas cenas que havia observado em visão. Ele declarou: ‘Eis que veio o Senhor entre Suas santas miríades, para exercer juízo contra todos e para fazer convictos todos os ímpios, acerca de todas as obras ímpias’” (Jd 14, 15; Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 60 [86]).

Perguntas para consideração

1. Por que Caim matou seu irmão? Elie Wiesel escreveu: “Por que ele fez isso? Talvez quisesse ficar sozinho [...]. Sozinho como Deus e talvez sozinho no lugar de Deus [...]. Caim matou para se tornar Deus [...]. Qualquer um que se considera Deus acaba assassinando outros” (Elie Wiesel, Messengers of God: Biblical Portraits and Legends [Nova Iorque: Random House, 1976], p. 58). Mesmo não cometendo assassinato, por que devemos ter o cuidado de não refletirmos a atitude de Caim?

2. Compare a expectativa de vida dos antediluvianos (Gn 5) com a dos patriarcas. Como explicar essa diminuição no tempo de vida? Como essa degeneração se opõe às premissas do darwinismo moderno?

Respostas e atividades da semana: 1. O nascimento de Caim trouxe esperança, pois Eva imaginava que ele fosse o Messias prometido, ao passo que o nascimento de Abel foi considerado algo comum. 2. Sem derramamento de sangue, não há remissão de pecado. O sacrifício do animal representava a morte vicária de Cristo. Caim demonstrou não crer em um Libertador. 3. Ciúmes e maldade. Pensava que estava sendo vítima de uma injustiça, e embora Deus o tivesse aconselhado para o bem, ele escolheu o caminho do mal. 4. Para que Caim refletisse sobre o que havia feito e se arrependesse. Ele temia que fizessem com ele o mesmo que tinha feito com seu irmão. Além disso, devido a seu pecado, ficaria longe da presença divina. 5. O pecado nos separa de Deus. Caim temeu pela própria vida. 6. O legado de Caim foi uma descendência rebelde. A intensificação e exaltação do mal por parte de Lameque afetaram as gerações seguintes.

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Resumo da Lição 3
Caim e seu legado

 

TEXTO-CHAVE: Gn 4:7
FOCO DO ESTUDO: Gn 4; Hb 11:4; Ap 6:9

ESBOÇO

Introdução: Gênesis 4, o capítulo seguinte da história humana, traz o primeiro nascimento anunciando a salvação messiânica e o primeiro ato de violência e morte. Os eventos dão uma ideia de como seria a vida humana após a queda, ou seja, mistura de vida e morte. Nascimento e crime estão interligados. A estrutura do capítulo 4 mostra essa tensão por meio da forma de sua estrutura quiástica, alternando entre o nascimento e o crime:

A. Nascimento a partir de Adão e Eva: Caim e Abel

B. Crime: Caim

C. Nascimento: legado de Caim e Lameque

B1. Crime: Lameque

A1. Nascimento a partir de Adão e Eva: Sete

A estrutura de Gênesis 4 traz várias lições. A salvação por parte de Deus encontra seu caminho por meio de uma série de contrastes entre Caim e Abel, em seus nomes e comportamentos e seus respectivos sacrifícios, e até mesmo entre Caim e Lameque. Embora os crimes de Caim e de Lameque ocupem todo o espaço, o capítulo é emoldurado pela esperança: começa e termina com a promessa messiânica. O capítulo começa com o nascimento de Caim e termina com o nascimento de Sete. Enquanto o nascimento de Caim conduz ao fracasso e tem um horizonte limitado feito de conquistas humanas e de violência, levando ao dilúvio, o nascimento de Sete traz reparação do fracasso anterior e restaura o plano divino de salvação, levando à sobrevivência da humanidade na história e à sua salvação.

COMENTÁRIO

O nascimento de Caim

Eva associou o nascimento de Caim à presença de YHWH. A mulher foi a primeira pessoa que mencionou o nome do Senhor (YHWH). Ela acreditava que o próprio Deus havia descido e Se tornado Aquele a quem ela tinha dado à luz: “Eu dei à luz um menino, o Senhor” (Gn 4:1). Essa tradução literal se justifica com base na gramática, pois o nome de Deus (YHWH) é introduzido pela mesma palavra, ‘et, que introduz o nome de Caim. Na verdade, todos os nomes pessoais, nesse verso, Eva, Caim e YHWH são introduzidos por essa partícula. Além disso, a frase ‘et qayin (“Caim”) é paralela à frase’ et YHWH (“o Senhor”). Essas duas frases ocorrem no mesmo lugar, concluindo a respectiva sugestão e, assim, ecoando uma na outra. Além disso, o uso da palavra ‘et antes de “o Senhor” marca uma forte ênfase nessa palavra.

Essa identificação é apenas um indício de como Adão e Eva devem ter se sentido. Lembrando-se da promessa de Gênesis 3:15, Eva pode ter pensado que tinha dado à luz seu Redentor. Ellen White interpreta essa passagem da seguinte maneira: “Depois que Adão e Eva ouviram pela primeira vez a promessa, aguardavam um cumprimento imediato dela. Receberam alegremente seu primeiro filho, na esperança de que fosse o Libertador” (O Desejado de Todas as Nações, p. 31).

Leia Gênesis 4:1, 2. Discuta o significado dos contrastes entre os dois irmãos. Caim nasceu antes de Abel. O nome Caim significa “adquirir”, “possuir”, enquanto o nome Abel significa “vapor”, “efêmero”, “vaidade”. Caim fala, enquanto Abel permanece em silêncio. Compare também suas ofertas (veja a seguir).

O sacrifício de Caim (Gn 4:3, 4)

Enquanto Caim escolheu tirar sua oferta apenas “do fruto da terra” (Gn 4:3), Abel, “por sua vez, trouxe” a oferta de sangue (Gn 4:4). Assim, em contraste com a oferta de Caim, a oferta de Abel estava em conformidade com a lei que exigia que um animal sacrifical fosse apresentado para a oferta queimada (Êx 29:39-41). No entanto, enquanto Abel obedeceu às instruções divinas, Caim optou por ignorá-las. Além disso, uma comparação entre os dois atos de oferecimento revela uma ligeira nuance entre eles. Enquanto Caim ofereceu “ao Senhor”, Abel apenas ofereceu. A menção “ao Senhor” está ausente na descrição do sacrifício de Abel.

Essa pequena diferença tem significado profundo, pois reflete dois pontos de vista fundamentalmente diferentes quanto à adoração. Enquanto Caim pensou em sua oferta como um presente a Deus, Abel entendeu seu sacrifício como um lembrete da dádiva de Deus para ele. Enquanto Caim considerava sua religião um movimento ascendente em direção a Deus, Abel a experimentava como um movimento descendente da parte de Deus. Essa mentalidade contrastante pode explicar também outra diferença sobre como as ofertas foram escolhidas. A oferta de Abel não era, em si, melhor que a de Caim. Na verdade, os frutos oferecidos por Caim devem até ter sido um produto melhor do que as ovelhas fornecidas por Abel. A diferença, entretanto, foi que Abel escolheu do bekorot, das “primícias”, o produto mais precioso da estação, de acordo com a legislação mosaica (Êx 23:19), ao passo que Caim tirou qualquer fruto da terra. A partir do contexto dos capítulos anteriores, cada uma das duas ofertas evocava algo diferente. A oferta dos frutos da terra (‘adamah) apon-
tava para Gênesis 3:19 e está associada ao esforço humano e à perspectiva da morte. A oferta de animais, por outro lado, aponta para Gênesis 3:21 e apresenta a promessa da proteção divina e a perspectiva de vida. A oferta de Caim foi a expressão do esforço humano para alcançar a Deus; a oferta de Abel foi a expressão da necessidade do ser humano da salvação oferecida por Deus. Além disso, estava relacionada à promessa do Cordeiro messiânico de Gênesis 3:15, que seria sacrificado para salvar o mundo, enquanto a oferta de Caim era um ritual vazio. Ob-
serve o mesmo contraste entre as vestes feitas por Adão e Eva (Gn 3:7), com folhas de figueira, versus a roupa feita por Deus, com a pele de animal, sugerindo o sacrifício de sangue (Gn 3:21).

O crime de Caim

O uso da frase wayyo’mer qayin “Caim disse”, ecoando a frase wayyo’mer YHWH ‘el qayin, “Então, o Senhor lhe disse” (Gn 4:6), indica que Caim deveria responder a Deus. No entanto, em vez de responder a Deus pela fé, Caim se voltou para seu irmão e o matou (Gn 4:8). É significativo o fato de o crime de Caim ter ocorrido imediatamente após essa mudança no diálogo da comunicação vertical deficiente para a horizontal. O mecanismo do primeiro crime religioso é então sugerido. Os zelosos cometem crimes não por sentir que estão certos; os crimes de fanatismo e intolerância religiosa derivam da falha em cumprir a Palavra de Deus. Quando a fé é substituída pelo esforço e controle humanos, o crime vem em seguida. Caim matou seu irmão, não porque sentia que estava certo e seu irmão errado, ao contrário, porque Caim era mau e seu irmão era justo (ver 1Jo 3:12).

O crime de Lameque

Também há um contraste entre o crime de Caim e o crime de Lameque. Ao contrário de Caim, Lameque levou o assassinato um passo adiante. Ele apresentou seu ato criminoso como algo positivo e valioso e literalmente se vangloriou disso. Enquanto Caim optou por permanecer em silêncio, Lameque, em contraste, escreveu uma canção. Enquanto Caim pediu misericórdia a Deus (Gn 4:13, 14), Lameque ignorou Deus e sujeitou suas esposas a uma ladainha sobre sua destreza e façanha homicida como algo digno de aprovação. A idêntica mudança de paradigma observada no crime de Caim também pode ser percebida neste caso: o fracasso na relação vertical (Deus-humano) produziu uma atitude violenta contra outro ser humano. Na verdade, Lameque moveu-se em direção oposta ao perdão. Ele falou de vingança, referindo-se a outros crimes posteriores. Até mesmo sua vingança é intensificada consideravelmente. Enquanto Caim seria vingado apenas sete vezes, Lameque exigiu um aumento para 77 vezes (Gn 4:24). É digno de nota que Jesus tenha sugerido o mesmo aumento com relação ao perdão (Mt 18:21, 22).

O nascimento de Sete

A repetição da primeira frase que introduziu o nascimento do primogênito Caim (Gn 4:1) sugere um retorno ao início. Além disso, a repetição da expressão “tornou a”, atrelada ao nascimento de Sete, ecoa a expressão “voltou a” associada ao nascimento de Abel (Gn 4:2, NVI). Assim, “tornou a” reconecta a linha interrompida da história nesse ponto: Sete substituiria Abel (Gn 4:25). Essa ideia também é registrada no nome do novo filho, Sete, que significa “colocar no lugar de”, conforme o que disse Eva. Além disso, o verbo hebraico shat, “nomeado”, que descreve a “nomeação” divina da “descendência” em Eva, é o mesmo verbo que descreve a “nomeação” divina, “pondo” (shat) “inimizade” entre a serpente e a mulher (Gn 3:15). Por meio dessa alusão a Gênesis 3:15, o autor bíblico aponta profeticamente para o evento da salvação manifestado na encarnação divina de Jesus Cristo.

Perguntas para discussão e reflexão: Como o nascimento de Sete apontou para Jesus Cristo?

APLICAÇÃO PARA A VIDA

Caim e Abel. Que lições de caráter podemos aprender com o contraste entre Caim e Abel? Caim fala enquanto Abel fica em silêncio. Caim é o primeiro, Abel é o segundo. Caim é violento, Abel é a vítima. Com quem você se identifica e por quê? Por que Abel representa os mártires de Deus (Ap 6:9; 20:4)?

A oferta a Deus. Que lições sobre religião podemos aprender com a comparação entre a oferta de Caim e a oferta de Abel? O que é mais importante: o que recebemos de Deus ou o que damos a Ele? Por que o dom de Deus é a única maneira de sermos salvos?

A ira de Caim. Leia Gênesis 4:6, 7 e Mateus 5:21-26. Por que Caim estava irado?

Lembre-se da última vez em que você ficou irado e analise seu sentimento, perguntando a si mesmo o seguinte: Como a ira prepara o coração humano para o assassinato? Como a falha religiosa de Caim se relaciona com sua falha em seu relacionamento com seu irmão? Por que o zelo religioso muitas vezes leva ao crime? Que lição de autocontrole podemos aprender com a ordem de Deus a Caim?

Crime de Lameque. Compare os crimes de Caim e Lameque. Em que sentido se identificam quanto à degeneração? Como se diferenciam em grau ou intensidade? Que lição podemos aprender com a sensibilidade de Lameque à bela poesia e a sensibilidade de seu filho em relação à música? A instrução em artes preserva da maldade? Discuta. Que exemplos na história indicam o contrário?

O nascimento de Sete. Depois que Caim matou Abel, Deus levantou outra semente justa, Sete, por meio da qual Ele poderia cumprir Seu propósito de redimir o mundo. Que lição essa mudança de planos nos ensina sobre a perseverança de Deus em salvar e Sua predisposição em trabalhar com a humanidade apesar de nossa fraqueza e de nosso fracasso?

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Um homem morto (parte 2)

Depois de trabalhar onze anos como colportor, recebi uma bolsa para estudar teologia na Universidade de Solusi, em Zimbábue. Entretanto, com quatro meses de aulas, minha esposa, Fortunate, e eu nos ferimos gravemente em um acidente de carro. Muitos milagres aconteceram que, até hoje, não compreendo. Eu não entendo como minha esposa e eu sobrevivemos a uma colisão frontal. Estávamos sentados à frente, mas os passageiros não sobreviveram.

Também não entendi porque não fiquei paralítico. Quando comecei os exercícios de fisioterapia, o fisioterapeuta perguntou: “Você é um homem de oração?” Respondi-lhe: “Sim, por quê?” Ele explicou: “Este raio-X mostra que você deveria estar paralisado do pescoço para baixo. Normalmente, uma pessoa com um raio-X como este estaria morta. Preciso ser muito cuidadoso com você. Tenho medo.”

Eu não entendo a chegada rápida da ambulância na cena do acidente. O gerente da mina de ouro local estava dirigindo um caminhão guincho atrás de nosso carro e viu o acidente. Imediatamente, chamou uma enfermeira que trabalhava na mina e pediu que ela chamasse imediatamente a ambulância da mina.

Também não entendo como recebi uma bolsa da igreja para estudar na Solusi três meses antes do acidente. Sem a bolsa, minha esposa e eu não receberíamos assistência médica e talvez morreríamos. Nossas contas do hospital alcançaram 36 mil dólares, uma soma enorme para Zimbábue.

Não entendo porque o único cirurgião ortopédico qualificado para operar meu pescoço no Zimbábue estava disponível no dia da minha cirurgia de emergência. Ele havia reservado um voo de avião para a França no mesmo dia do procedimento. No entanto, operou-me pela manhã e pegou seu voo naquela tarde.

Então, perguntei a Deus: “Por que Tu nos preservaste? Deveríamos ter morrido instantaneamente!” Tenho duas respostas possíveis. Talvez minha esposa e eu não estivéssemos preparados espiritualmente para morrer e Deus nos deu outra chance de estarmos prontos para a manhã da ressurreição. Ou, talvez Deus nos poupou, porque ainda temos trabalho a fazer em Sua vinha. Certo é que minha vida de oração mudou desde o acidente. Oro mais vezes e peço a Deus que me dê forças para fazer boas ações o tempo todo. Peço-Lhe que trabalhe em quaisquer fraquezas que eu tenha, para que eu esteja preparado, caso morra a qualquer momento.

Também peço que Ele me ajude a não perder o desejo de para fazer a Sua vontade. Oro sempre: “Dá-me forças e zelo, para que eu possa cumprir o que desejas que eu faça em Tua obra”. Às vezes, cometo erros, mas sempre vou a Deus e confesso: “Sinto muito por ter errado. Eu não consigo me controlar sem o Seu amparo. Dê-me forças, Senhor.” Oro para que meu relacionamento com Deus seja sempre bom. “Deixe-me fazer o que o Senhor quer que eu faça. Ajude-me a não perder o desejo de estar ao Seu lado.” Não sei como Deus operou o milagre no dia do acidente, 23 de dezembro de 2015. Mas eu sei que ainda estou aqui – e servirei a Ele todos os meus dias.

Em 2015, parte da oferta trimestral foi destinada à Universidade de Solusi, a fim de ampliar a capacidade do refeitório, de 500 para mil assentos. Muito agradecemos pelas ofertas que permitem a escolas adventistas como Solusi preparar pessoas com o objetivo de proclamar ao mundo a vinda de Jesus.

Informações adicionais

  • Peça que um homem apresente esta história na primeira pessoa.
  • Assista ao vídeo sobre Alfred YouTube: bit.ly/Eugene-Fransch.
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Esta história ilustra o Objetivo de Liderança no 8 do plano estratégico da Igreja Adventista “I Wil Go” (Eu irei): “fortalecer o discipulado de pastores, professores e outros obreiros da linha de frente e oferecer oportunidades periódicas de crescimento.” O projeto trimestral da Universidade de Solusi ilustra o objetivo missionário no 4: “fortalecer as instituições adventistas na defesa da liberdade, saúde integral e esperança através de Jesus, restaurando pessoas à imagem de Deus.” Saiba mais sobre o plano estratégico em IWillGo2020.org.

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Comentário da Lição da Escola Sabatina – 2º Trimestre de 2022
Tema Geral: Gênesis
Lição 3 – 9 a 15 de abril de 2022

Caim e seu legado

Autor: Wilian S. Cardoso

Editoração: André Oliveira Santos: andre.oliveira@cpb.com.br

Revisora: Josiéli Nóbrega

Enquanto Gênesis 2 e 3 contam sobre a vida humana dentro do Jardim, o capítulo 4 apresenta um novo episódio da experiência humana, porém, dessa vez, fora do Éden. A famosa história de Caim e Abel, descrita no capítulo 4 de Gênesis, é intrigante para muitos leitores. Muitos se questionam, por exemplo, por qual razão Deus teve preferência por apenas uma das ofertas? Se esse episódio não houvesse ocorrido, a sequência de eventos descritos ali teria sido totalmente diferente. Qual seria a exata mensagem desse relato, uma vez que existe uma constante mudança entre os gêneros de genealogia e narrativa dentro do capítulo? De fato, as respostas podem não parecer óbvias se lermos a história individualmente,; separada do capítulo 3, por exemplo. Isso porque há inúmeros paralelos entre Gênesis 4 e 3, os quais são, não apenas temáticos, mas inclusive terminológicos,; o que nos leva a entender uma conexão entre as histórias.

Veja a seguir:

Essa evidente conexão entre os capítulos tem que ver com o fato de Gênesis 4 ser apresentado como uma realização prévia da maldição proferida por Deus no capítulo 3. Como sabemos, e vimos na semana passada, a ênfase de Gênesis 3 está no conhecimento do mal que conduz à morte, e então seu efeito real começa a ser percebido e a se desenvolver de forma acelerada por meio das ações humanas. Além disso, o relato sobre a queda apresentou a grande promessa de um nascimento que destruiria o poder maléfico da serpente, eliminaria a maldição da morte e traria toda criação à sua forma original. E é precisamente sobre esses dois elementos que Gênesis 4 se desenvolve: a morte e o nascimento.

Esse contraste entre morte e nascimento é, obviamente, retirado da parte central de Gênesis 3, ou seja, o versículo 15, que apresenta a sentença-promessa divina em um duplo destino de geração e morte. Aparentemente essa declaração foi altamente significativa para o primeiro casal, bem como para todo o processo da revelação divina dentro das Escrituras, uma vez que os elementos essenciais dela são desenvolvidos dentro do capítulo 4. Abruptamente, a história começa com a descrição da geração de um descendente. Curiosamente, Gênesis 4:1 é considerado um verso cheio de dificuldades para os tradutores e intérpretes em várias de suas palavras. Entre elas, a expressão “com o auxílio do Senhor”, em 4:1, é considerado por muitos, uma tradução desajeitada e possivelmente imprecisa, uma vez que a construção hebraica et-Adonai dificilmente contém a ideia de “com ajuda de”. A pequena partícula et possui um duplo significado: ou uma preposição (com, junto a) ou simplesmente um termo sem tradução que serve para indicar que o que se segue após ela é o objeto direto definido da oração. Naturalmente, grande parte das traduções apresenta a compreensão dessa pequena parte do texto como uma preposição, já que vê-la como objeto direto pareceria estranho, porque produziria a ideia de que Eva gerou um homem, isto é, “o Senhor” em pessoa. Ainda que isso soe estranho, a expressão et-Adonai em nenhum outro texto do Pentateuco aparece como uma ideia preposicional, mas unicamente declara que “o Senhor” é o complemento direto de um determinado verbo. 

Além disso, analisando-se o contexto, a tradução “adquiri um varão – o Senhor” é muitas vezes mais favorável. Pois está claro que Eva reacendeu sua fé na bondade de Deus e na veracidade de Sua palavra prometida em 3:15.

Ou seja, no afã de que a promessa divina fosse realizada iminentemente e que o status e condição da criação pudesse voltar ao normal o mais breve possível, Eva viu em seu primeiro filho o Messias prometido. Mas ainda que decepcionada por sua conclusão precipitada e má interpretação da promessa, sua esperança não foi abalada, já que no fim do capítulo, no verso 25, ao descrever o nascimento do novo filho, suas palavras são construídas com os mesmos termos essenciais de 3:15.

Os capítulos 1 e 2 igualmente têm um papel importante para entender a dinâmica do capítulo 4. Pois, em tese, Gênesis 1 trata da relação entre Deus e o ser humano (1:26-30), enquanto Gênesis 2 trata da relação dos seres humanos entre si. Isto posto, a narrativa de Caim e Abel deve ser entendida como um exemplo negativo do mandamento de amor duplo, a saber: a falha em amar a Deus e ao próximo. 

Em outras palavras, Gênesis 4 “ilustra vividamente como a alienação de Deus produz a alienação de uma pessoa para com seus semelhantes”. 

De igual modo, a história relata sobre o poder do mal, mostrando já na primeira descendência humana o que os seres humanos são capazes de fazer. Mas, em contrapartida, também deixa claro que esse é um tipo de poder não compartilhado por Deus e que jamais é deixado impune. Por outro lado, Gênesis 4 não é apenas a primeira narrativa sobre pecado e culpa que passam a oprimir dali para a frente a humanidade; é também, ao mesmo tempo, uma exposição da misericórdia e do perdão divinos que se desdobram a cada evento na história do homem.

Enfim, embora repleta de tragédias, o drama do capítulo 4 nos ensina uma lição valiosa de como viver com sinceridade. Pelo exemplo deles (positivo e negativo), aprendemos que não somente nossas ações, mas nosso comportamento são importantes perante Deus – e quão devastadoras podem ser as consequências do pecado. O destino fatídico que se seguiu não tem que ver com uma preferência divina sobre pessoas ou aquilo que elas podem oferecer a Ele, mas unicamente com a sinceridade do coração humano. O grande conflito da adoração é apresentado já a partir dessa história. A verdadeira adoração não está atrelada ao que podemos dar de forma física, mas, sim, a um coração sincero, submisso e obediente. É somente pela misericórdia de Deus que podemos aprender a viver “com simplicidade e sinceridade de Deus, não com sabedoria humana, mas na graça divina” (2Co 1:12).

O personagem principal, Caim, cometeu um erro, mas recebeu o perdão e a graça de Deus (4:15); contudo, preferiu usar sua própria sabedoria. Quando lhe foi dito que vagueasse (4:12), ele escolheu fixar-se e construir uma cidade (4:16, 17). Eva, por outro lado, a despeito das perdas e desilusões, elementos esses que se tornariam tão comuns na dinâmica da vida humana diária, decidiu não perder a esperança. Sua fé não se abalou e a palavra de Deus continuou sendo seu fundamento. É como se ela dissesse: “Errei uma vez em não seguir a palavra de Deus, mas não errarei mais”. Na história da vida e do relacionamento com Deus, Gênesis 4 nos informa que há somente dois tipos de pessoas: Caim-Lameque ou Abel-Eva. Quem você será, depende exclusivamente das suas escolhas.

Referências:

(1) DOUKHAN, Jacques B. Genesis. Seventh-Day Adventist International Bible Commentary. Oakland, CA: Pacific Press, 2016, pp. 114, 15.

(2) Veja, por exemplo: Gn 24:48; 25:22; 29:35; Êx 5:2; 10:7, 8, 11, 24, 26; 12:31; 14:31; 17:2, 7; Nm 11:20; 15:30; 16:30; 20:13; Dt 4:29; 6:2, 12, 13, 16, 24; 8:10, 11, 14, 18, 19; 10:12, 20; 11:13, 22; 13:4; 14:23; etc. É válido lembrar que a transitividade dos verbos entre idiomas diferentes nem sempre é a mesma, ou seja, verbos que são transitivos diretos em uma língua podem ser indiretos na outra e vice-versa.

(3) MATHEWS, Kenneth A. Genesis 1-11:26. The New American Commentary. Nashville, TN: Broadman and Holman Publishers, 1996, p. 265.

(4) MOBERLY, R. W. L. The Theology of the Book of Genesis. Oxford: Cambridge University Press, 2009, p. 88.

(5) SCOBIE, Charles H. H. The Ways of Our God: an approach to biblical theology. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2003, p. 163.

Conheça o autor dos comentários para este trimestre: Wilian Cardoso é casado com Carem Cardoso. É pai de Sarah Cardoso, Noah Cardoso e de Shai Cardoso. É bacharel em Teologia e Filosofia, mestre em Interpretação Bíblica e em Estudos do Antigo Oriente Médio. Trabalhou como pastor da Comunidade Judaico-Adventista de Manaus por 8 anos e também como professor de Filosofia e Sociologia. Atualmente trabalha como professor para o Israel Institute of Biblical Studies filiado à Universidade Hebraica de Jerusalém e se dedica à família e à vida acadêmica.