No centro da cidade em que moramos, há a praça da Matriz. Minha filha a chama de “praça dos pombos”, porque o lugar vive cheio dessas aves dóceis. Uma das diversões preferidas da Ana é correr entre os pombos e alimentá-los. Em geral, quando vamos até lá, levamos canjiquinha de milho para vermos os pombos se aglomerarem em torno da comida.
Como, naquela manhã, nosso destino original não era a “praça dos pombos”, saímos sem a canjiquinha, mas decidimos mudar nossa rota para brincar com os pombos. A Ana deu a ideia de comprarmos a canjiquinha no supermercado bem em frente à praça.
Quando abri minha carteira, porém, percebi que tinha deixado dinheiro e cartões em casa. A Ana ficou um pouco triste, mas ainda assim topou passear um pouco na praça e correr entre os pombos que estavam por ali. Enquanto estávamos tentando atrair as aves, mas sem a isca da canjiquinha, percebi que um homem com a roupa toda suja e rasgada se aproximou de nós. Ele aparentava ter cerca de 60 anos de idade.
A princípio, fiquei um pouco incomodado com a insistência dele em olhar para a Ana. Contudo, sua expressão facial revelava algo de carinho e havia nele um tom que, de alguma forma, me lembrava meu pai.
Ele estava comendo um pão francês, possivelmente o único alimento que havia conseguido até aquela hora. Ana não o percebeu, absorta entre os poucos pombos que insistiam em ficar perto dela, mesmo sem oferta de comida. O tempo passou um pouco e, envolvido na tentativa de animar minha filha, esqueci o pobre homem de rua. Porém, ele fez algo que eu não esperava. Levantou-se do banco, com a metade de seu pão na mão e, com um sorriso bem ao estilo vovô, jogou seu café da manhã para cima com o simples objetivo de fazer uma criança feliz. Os pombos não se fizeram de rogados e centenas deles pousaram no chão da praça para comer as migalhas de pão.
Mancando e escorado em uma muleta, o idoso foi saindo com uma expressão de satisfação no rosto. Eu fiquei ali paralisado com a poesia daquele momento, envolvido pela felicidade inocente de uma criança e a bondade de um anônimo, que deu toda a comida que tinha para alegrar minha filha. Produzidos com a mais pura sinceridade e desprendimento, gestos desse tipo recebem a aprovação do Céu. Foi assim com a viúva pobre, com o morador de rua e pode ser com você também.