Para onde Deus levou os israelitas depois de libertá-los? Talvez você responda: “Para o deserto e, depois, para a terra prometida.” Mesmo que essa resposta esteja correta quanto à geografia, ela está errada quanto à teologia. Deus respondeu: “Vocês viram o que fiz aos egípcios e como levei vocês sobre asas de águia e os trouxe para perto de Mim” (Êx 19:4; grifo nosso). A resposta teológica à pergunta revela a prioridade e o objetivo divinos: Ele os levou para perto de Si mesmo.
Quando nos afastamos, Deus nos procura e nos chama de volta. O melhor exemplo dessa verdade está no Éden, quando Adão e Eva pecaram e se esconderam de Deus. Ele perguntou: “Onde você está?” (Gn 3:9). Ele sempre dá o primeiro passo. Jesus chamou: “Venham a Mim todos vocês que estão cansados e sobrecarregados, e Eu os aliviarei. Tomem [...] o Meu jugo e aprendam de Mim, porque sou manso e humilde de coração; e vocês acharão descanso” (Mt 11:28, 29, grifo nosso).
Deus chama a todos nós. Nosso destino eterno depende de nossa resposta.
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1. Leia Êxodo 19:1-8. O que Deus prometeu aos israelitas, no pé do monte Sinai?
Deus levou os israelitas ao monte Sinai, onde pouco depois lhes daria os Dez Mandamentos (o Decálogo). O Jebel Musa (“monte de Moisés”, em árabe), que fica na península do Sinai e tem 2.285 metros de altitude, provavelmente seja o local em que Moisés se encontrou com Deus várias vezes (Êx 3:1; 19:2; 24:18) e, séculos depois, Elias fez o mesmo (1Rs 19:8). Essa é também a montanha em que Deus chamou Moisés para liderar Israel (Êx 3:1, 10). Naquele momento, Deus informou a Moisés que ele adoraria ao Senhor naquele mesmo local, junto com os israelitas libertados, o que seria um sinal de que o Deus de Abraão, Isaque e Jacó os estava conduzindo (Êx 3:12).
Após dois meses de viagem, os israelitas chegaram ao Sinai (Êx 19:1), onde ficaram cerca de um ano (Êx 19:1; Nm 10:11, 12). Naquele ano, Deus entregou inúmeras leis (Êx 19–40; Lv 1–27; Nm 1:1–10:10). A estada de Israel no monte Sinai é o elemento central da narrativa encontrada nos primeiros cinco livros da Bíblia. Naquele momento Israel foi estabelecido como o povo escolhido de Deus, a única nação que não havia mergulhado no paganismo e na idolatria.
Deus tomou a iniciativa e estabeleceu a aliança entre Ele e Israel. Sob a condição da obediência do povo e de manter um relacionamento com Ele, Deus prometeu fazer dele “tesouro especial”, “reino de sacerdotes” e “nação santa” (Êx 19:5, 6, NVI).
Ser um povo santo significa ser dedicado a Deus e revelar Seu caráter aos outros, especialmente às nações ao redor. Israel também foi chamado para atuar como um reino de sacerdotes que conectaria pessoas com Deus, levando-as a Ele e ensinando-lhes Sua vontade e Suas leis. Israel devia ser o tesouro especial de Deus, porque Ele desejava que Seu povo se tornasse Seu canal para iluminar o mundo.
Essa aliança foi o estabelecimento legal do relacionamento entre Deus e Seu povo. A fórmula geral da aliança, com leves variações nos textos, é: “Eu serei o Deus deles, e eles serão o Meu povo” (Jr 31:33; Êx 6:7; Lv 26:12; Jr 24:7; Hb 8:10; Ap 21:3)
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2. Como Deus preparou Israel para receber os Dez Mandamentos? Êx 19:9-25
Deus deu instruções sobre o fazer a fim de se preparar para a entrega da lei no Sinai. A pureza externa devia refletir a dedicação total a Deus. Israel precisava estar pronto para a manifestação da glória do Senhor. Esse evento foi acompanhado por “trovões e relâmpagos, uma espessa nuvem cobriu o monte, e ouviu-se um forte som de trombeta, de maneira” que o povo “tremeu de medo” (Êx 19:16).
Os Dez Mandamentos ocupam o centro da revelação divina e da ética bíblica. Eles formam a substância e o fundamento dos padrões divinos para toda a humanidade. Seus princípios são eternos e universais.
De acordo com o relato bíblico, o Decálogo foi proclamado por Deus (Êx 19:19; 20:1; Dt 5:4, 5, 24) e escrito por Ele (Êx 24:12; 31:18; Dt 5:22). Foi dado duas vezes a Moisés como uma dádiva especial (Êx 32:19; 34:1; Dt 10:1, 2).
O Decálogo é chamado de tábuas do “testemunho” (em hebraico, ‘edut; Êx 31:18) ou “palavras da aliança” (dibre habberit; Êx 34:28). Elas foram escritas nas “tábuas da aliança” (Dt 9:9, 11, 15). No texto original, o Decálogo nunca é chamado de “Dez Mandamentos” (em hebraico, “mandamentos” é mitzvot). Em vez disso, três vezes é chamado, literalmente, de “as Dez Palavras” (‘aseret haddebarim; Êx 34:28; Dt 4:13; 10:4). Essa expressão vem de dabar, que significa “palavra, sentença, assunto, coisa, discurso, história, promessa, declaração”.
A Bíblia apresenta duas versões do Decálogo, com diferenças muito pequenas: a primeira está registrada em Êxodo 20:1-17, e a segunda, em Deuteronômio 5:6-21. A segunda versão, apresentada oralmente por Moisés a Israel, foi dada quase 40 anos depois do Sinai, pouco antes de o povo entrar na terra prometida (Dt 1:3, 4; 4:44-47). Essas circunstâncias explicam as pequenas diferenças entre as duas versões.
Quando Paulo resumiu a lei de Deus como amor, ele citou o Decálogo (Rm 13:8-10). O amor é a essência da lei de Deus porque Ele é um Deus de amor (1Jo 4:16).
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3. Quais são os princípios do Decálogo e como ele está organizado? Êx 20:1-17
O Decálogo não começa com os mandamentos, mas com a ação de Deus para com Seu povo, revelando a graça (Êx 20:2). O Senhor primeiro mostrou Sua graça ao dar liberdade e salvação a Israel, e só então revelou Sua vontade. Os mandamentos deviam ser observados por amor e gratidão pelo que Deus havia feito pela nação.
A palavra-chave no Decálogo é “amor” (Rm 13:10). O mandamento supremo é o amor, expresso de dois modos: amor a Deus (Dt 6:5) e amor ao próximo (Lv 19:18).
Nos quatro primeiros mandamentos, o Decálogo explica o que significa amar a Deus; nos seis mandamentos seguintes, explica o que significa amar o próximo. O Decálogo começa com o princípio de honrar a Deus acima de tudo (amor vertical) e continua com o respeito aos outros (amor horizontal):
1. Honrar e reverenciar a Deus dando a Ele o primeiro e mais elevado lugar em todas as situações de nossa vida (primeiro mandamento).
2. Honrar e preservar a posição exclusiva de Deus e não substituí-Lo por algum ídolo de qualquer forma, seja física, simbólica ou espiritual. Nossas afeições mais puras pertencem ao Senhor (segundo mandamento).
3. Reverenciar o nome de Deus – Seu caráter e reputação (terceiro mandamento).
4. Honrar Seu dia de descanso e adoração – o sábado (quarto mandamento).
5. Respeitar os pais (quinto mandamento).
6. Respeitar a vida (sexto mandamento).
7. Respeitar o casamento (sétimo mandamento).
8. Respeitar a propriedade das pessoas (oitavo mandamento).
9. Respeitar a reputação dos outros (nono mandamento).
10. Respeitar a si mesmo para que nenhum desejo egoísta manche seu caráter (décimo mandamento).
Jesus disse: “Se vocês Me amam, guardarão os Meus mandamentos” (Jo 14:15; 1Jo 4:20, 21). A verdadeira obediência é uma expressão de amor e gratidão para com o Senhor, um amor expresso poderosamente na forma como tratamos o próximo.
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A lei de Deus revela Seu caráter, quem Ele é. Assim como Deus é santo, justo e bom, também é Sua lei. “A lei é santa e o mandamento é santo, justo e bom” (Rm 7:12).
A lei é vista de maneira bastante positiva (Mt 5:17, 18; Jo 14:15; 1Co 7:19). Os escritores bíblicos escreveram poemas sobre a lei (Sl 119), cantaram sobre ela (Sl 19) e meditavam sobre ela dia e noite (Sl 1:2; Js 1:8). A lei nos ajuda a ficar longe do mal e nos concede sabedoria, entendimento, saúde, prosperidade e paz (Dt 4:1-6; Pv 2; 3).
1. A lei de Deus é como uma cerca que cria um grande espaço livre para a vida e mostra que, além de um limite específico, existem perigos, dificuldades, complicações e até mesmo morte (Gn 2:16, 17; Tg 2:12).
2. A lei também é como uma placa de sinalização que aponta para Jesus, o qual perdoa nossos pecados e transforma nossa vida (2Co 5:17; 1Jo 1:7-9). Ela é um paidagogos (“guardião”, NAA; ou “tutor”, NVI) que nos leva a Cristo (Gl 3:24).
4. Leia Tiago 1:23-25. O que esse texto diz e como essas palavras nos ajudam a perceber qual é a função e a importância da lei, mesmo que ela não possa nos salvar?
Um espelho revela nossos defeitos, mas não pode removê-los. Mostra os problemas, mas não oferece solução para eles. Ocorre o mesmo com a lei de Deus. Tentar ser justificado diante de Deus guardando a lei seria como olhar para o espelho esperando que, mais cedo ou mais tarde, ele faça nossos defeitos desaparecerem.
Uma vez que a salvação é pela fé e não pelas obras, nem sequer as obras da lei, alguns cristãos concluem que a lei foi abolida e que não precisamos mais guardá-la. A Bíblia, no entanto, ensina que a lei define o que é pecado: “Eu não teria conhecido o pecado, a não ser por meio da lei” (Rm 7:7). Portanto, essa ideia é uma interpretação bastante equivocada da relação entre a lei e o evangelho. A existência da lei é exatamente o motivo pelo qual precisamos do evangelho.
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5. Leia Romanos 3:20-24. Paulo foi claro ao ensinar que não podemos ser salvos pela obediência aos Dez Mandamentos. Qual é, então, o papel deles em nossa vida?
O termo hebraico que se refere aos Dez Mandamentos (dabarim; Êx 34:28; Dt 4:13; 10:4) não significa literalmente “mandamentos”, mas “palavras”. Além disso, dabar pode significar “promessa”. É por isso que, em várias passagens, esse termo é traduzido expressando a ideia de promessa (1Rs 8:56; 2Cr 1:9; Ne 5:12, 13; Dt 1:11; 6:3; 9:28; Js 9:21; 22:4; 23:5).
Ellen G. White escreveu: “Os Dez Mandamentos [...] são dez promessas” (Comentário Bíblico Adventista, v. 1, p. 1105). Devemos entender o Decálogo como promessas de Deus que nos guiarão no caminho certo para que Ele possa fazer coisas maravilhosas por nós. Mas, para isso, devemos obedecer-lhes.
6. Como entender a declaração de Paulo de que Cristo é o “fim da lei”? Rm 10:4
Paulo afirmou que Jesus Cristo é o “fim” (em grego, telos) da lei, mas não no sentido de que Ele a tenha abolido ou eliminado. “Em vez disso, significa que Cristo é o objetivo e a finalidade da lei”. “Cristo é o propósito para o qual a lei foi dada. Como resultado, todo o que Nele crê é declarado justo” (Rm 10:4, NVT). Não quer dizer que o sacrifício expiatório de Cristo não deu fim à validade e perpetuidade da lei.
Paulo destacou a importância da lei, bem como sua legitimidade e autoridade permanente (Rm 3:31; 1Co 7:19; Gl 5:6). A palavra telos indica especialmente propósito (finalidade), e não tempo (término). Cristo é a chave que desvenda o verdadeiro significado e propósito da lei de Deus. Portanto, seria incorreto afirmar que Ele tenha invalidado, substituído ou abolido a lei. Cristo é o objetivo da lei, Aquele para quem ela aponta.
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Leia, de Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 254-265 (“A lei de Deus”); 280-290 (“O inimigo da lei”).
“Deus pretendia fazer da ocasião em que pronunciaria Sua lei uma cena de impressionante e respeitável grandeza, à altura do exaltado caráter daquela lei. O povo precisaria compreender que todas as coisas ligadas ao serviço de Deus devem ser consideradas com a maior reverência” (Ellen G. White, Patriarcas e Profetas [CPB, 2022], p. 254).
O princípio da reverência brota da compreensão da majestade de Deus. Ao contemplar Sua glória, o coração se enche de gratidão e o orgulho é humilhado. Quanto mais perto vemos Sua santidade, mais vemos nossas imperfeições, levando-nos a ter sede de Sua presença transformadora e o desejo de ser semelhantes a Ele. Saber quem somos, em contraste com Deus e Sua lei, nos torna dependentes da morte substitutiva de Cristo por nós.
Jesus afirmou que, se humildemente aceitarmos Deus como Senhor, Seus mandamentos não serão pesados (Mt 11:28-30). Ele disse que a lei divina tem validade permanente (Mt 5:17-20). Quando observamos as leis de Deus por amor e gratidão a Ele, pela salvação que nos concedeu gratuitamente, experimentamos a plenitude de um relacionamento salvífico com Ele. Além de desfrutar as vantagens de guardar a lei (afinal, violá-la só traz sofrimento e dificuldades), temos a certeza de saber que nossa salvação é encontrada em Jesus, e não em nossa observância da lei.
Perguntas para consideração
1. A preparação para receber a lei ajudou Israel a ter a reverência de que precisavam. Hoje existe a mesma reverência e temor diante de Deus?
2. Reflita sobre a fórmula da aliança: “Eu serei o Deus deles, e eles serão o Meu povo.” O que isso significa? Como isso se revela em nós?
3. O que Deus nos ordena fazer, Ele nos capacita a realizar. Ellen G. White afirma que “todas as Suas ordens são promessas habilitadoras” (Parábolas de Jesus [CPB, 2022], p. 192). Como aplicar essas promessas (em hebraico, dabarim)?
4. Como responder à ideia de que, após a cruz, a lei foi anulada? Na maioria dos casos, o que os adeptos dessa ideia acreditam que foi abolido?
Respostas às perguntas da semana: 1. Prometeu fazer dos israelitas Seu tesouro especial, reino de sacerdotes e nação santa. 2. Deu instruções de como o povo deveria se purificar para o encontro com Ele. 3. O Decálogo está organizado em duas partes, que revelam princípios de relacionamento com Deus e com o próximo. 4. A lei de Deus é como um espelho que mostra nossos defeitos. 5. Os mandamentos de Deus revelam nossos pecados e nossa necessidade do Salvador. 6. Cristo é o propósito para o qual a lei de Deus aponta.
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TEXTO-CHAVE: Ex 19:4-6
FOCO DO ESTUDO: Êx 19:1-25; 20:1-20
ESBOÇO
Introdução: No Sinai, Deus estabeleceu uma aliança com Seu povo. Ele foi o Iniciador do contrato. Como Iniciador, Deus deu graça ao Seu povo e estabeleceu um relacionamento com ele. Deus queria que Israel fosse Seu povo especial, Sua posse preciosa, um reino de sacerdotes, uma nação santa. O sucesso de Israel dependeria de sua resposta positiva à orientação amorosa de Deus e aos atos poderosos que Ele realizou em seu favor no Egito e no caminho para o Sinai. Deus já o tinha convidado a segui-Lo e provou que planejava dar-lhe um futuro brilhante. Se ele apenas mantivesse Seus ensinamentos e buscasse cultivar um relacionamento genuíno com o Senhor, Deus seria capaz de conduzi-lo de uma forma sem precedentes à terra prometida. O povo precisava compreender quem Deus é e o que fazia por ele, para que pudesse admirá-Lo, amá-Lo, obedecê-Lo e adorá-Lo. A dádiva do Decálogo revelou princípios para uma vida feliz, equilibrada e próspera.
Temas da lição: Ao conduzir Israel para fora do Egito e guiá-lo através do Mar Vermelho e do deserto até o monte Sinai, Deus desejou trazê-lo para Si mesmo (Êx 19:4). Por cerca de um ano, Ele o ensinou por meio desse processo. Deus era como um Pai amoroso para Seu povo, instruindo-o sobre o que era melhor para sua prosperidade. O povo viu como Deus derrotou as divindades egípcias e cuidou de cada um no tempo das pragas e durante sua fuga do Egito. Então, o Senhor lhe deu a dádiva mais preciosa: o Decálogo, para ensiná-lo a temê-Lo (Êx 20:20). Refletiremos nesta lição sobre as diferentes funções da lei de Deus.
COMENTÁRIO
O Decálogo é o cerne da revelação de Deus e da ética bíblica, fundamentado na salvação. Considerado a Magna Carta do ensino bíblico, ele representa a norma de todas as normas, sendo a essência e base dos padrões divinos para toda a humanidade. Seus princípios são eternos. O relato do Pentateuco sobre a entrega do Decálogo sublinha que ele foi anunciado por Deus (Êx 19:19; 20:1; Dt 5:4, 5, 24) e também foi escrito por Ele (Êx 24:12; 31:18; Dt 5:22). Foi dado duas vezes a Moisés como uma dádiva especial (Êx 32:19; 34:1; Dt 10:1, 2). No Livro de Êxodo, o Decálogo é chamado de “testemunho” (Êx 31:18), e “as palavras da aliança” (Êx 34:28; a expressão “os Dez Mandamentos” não aparece no hebraico, embora sejam chamados de “mandamentos” em Êxodo 20:6. Em vez disso, o Decálogo é três vezes chamado de “as Dez Palavras” (hebraico: ‘aseret haddebarim; veja o uso em hebraico em Êx 34:28; Dt 4:13; 10:4).
Tanto em Êxodo quanto em Deuteronômio, o Decálogo está no início das coleções de leis e sua interpretação. Existem duas versões do Decálogo, com diferenças sutis entre elas: a primeira está em Êxodo 20:1 a 17, e a segunda em Deuteronômio 5:6 a 21. A segunda versão, apresentada oralmente por Moisés ao povo de Israel, foi transmitida quase 40 anos depois, pouco antes da entrada na terra prometida (Dt 1:3, 4; Dt 4:44-47), na qual ele agora enfatiza a redenção dada a eles no êxodo. Quando Paulo resumiu a lei em amor, ele citou o Decálogo (Rm 13:8-10; Gl 5:14). De fato, o amor é a essência da lei de Deus, pois Ele é o Deus do amor (1Jo 4:16).
Embora leis específicas do Decálogo já fossem conhecidas em poucas palavras antes do Sinai, o próprio Deus escolheu apresentar formalmente o Decálogo ao Seu povo e à humanidade. Isso porque esses mandamentos refletem, de forma sistemática, quem Ele é, Seu caráter e Seus valores.
A função da lei não é nos ensinar a ganhar salvação por meio de sua observância. Ou seja, não devemos guardar a lei de Deus para ser salvos, mas porque somos salvos. A lei não é fonte de vida, mas o meio pelo qual manifestamos e expressamos a vida que temos.
Na Bíblia, a lei de Deus é retratada de forma muito positiva (Mt 5:16, 17; Jo 14:15; Gl 3:21; 1Co 7:19). É possível criar poemas sobre a lei (como no Salmo 119, uma verdadeira obra-prima), cantar sobre ela (Sl 19) e meditar nela dia e noite (Sl 1:2; Js 1:8) porque a lei nos protege do mal e traz sabedoria, entendimento, saúde, prosperidade e paz (Dt 4:1-6; Pv 2; 3).
O Decálogo tem várias funções cruciais:
1. A lei de Deus é uma garantia de liberdade (Gn 2:16, 17; Tg 2:12). É como uma cerca que cria um grande espaço livre para a vida e avisa que além de um ponto específico há perigo, problemas, complicações e morte. Não há futuro para aqueles que saem do círculo da liberdade.
2. A lei é um espelho (Tg 1:23-25). Através dela podemos ver o quanto somos sujos e o quanto precisamos ser purificados. O Decálogo revela nossa pecaminosidade; no entanto, ele não pode nos purificar do pecado ou da culpa (Rm 3:20).
3. A lei de Deus é um sinal. Como tal, ela nos leva como um paidagogos, ou professor, a Cristo (Gl 3:24). Ela aponta para Jesus, que nos limpa, perdoa nossos pecados e muda nossa vida (2Co 5:17; 1Jo 1:7-9).
4. O Decálogo é a promessa de Deus para nós. Ao proclamar essas leis, Deus promete que esses padrões farão parte de nossa vida se mantivermos um relacionamento próximo com Ele. O Senhor é o Fiador que tornará esses padrões nosso estilo de vida permanente. Estaremos tão próximos Dele que não desejaremos aquilo que é proibido. Encontraremos alegria em nossa comunhão com Ele pedindo que Ele realize essa obediência em nós pelo poder de Sua graça, de Sua Palavra e de Seu Espírito Santo.
No Decálogo, os mandamentos quatro e cinco são apresentados em hebraico como comandos positivos na forma do infinitivo absoluto, que possui dois significados em textos legais: um comando ou uma promessa enfática (veja E. Kautzsch, ed., Gesenius’ Hebrew Grammar [Oxford: Clarendon, 1910], par. 113bb e 113ee). Os outros mandamentos são expressos como comandos negativos empregando a partícula de negação l’o (“não”) seguida do jussivo (uma forma imperfeita). Além de o significado dessa expressão em hebraico indicar uma proibição permanente, ou seja, um mandamento, sugere-se que ela também transmite uma situação futura, sendo, portanto, uma promessa. (Veja Jacques B. Doukhan, Hebrew for Theologians: A Textbook for the Study of Biblical Hebrew in Relation to Hebrew Thinking [Lanham, MD: University Press of America, 1993], p. 41). À luz dessa sugestão, uma tradução adequada poderia ser “você não irá [...]” e não “você não deve [...]”. Apoio para a compreensão do Decálogo como uma promessa pode ser encontrado em Juízes 6:23, onde o Senhor promete a Gideão: “Você não morrerá”. A construção gramatical nessa frase é exatamente a mesma do Decálogo.
O significado em hebraico do termo dabar, usado para descrever os Dez Mandamentos, não significa necessariamente “mandamento”, mas “palavra” ou “promessa”. Depende das versões em inglês, mas veja, por exemplo, o uso do substantivo dabar como “promessa” em 1 Reis 8:56; 2 Crônicas 1:9; Neemias 5:12, 13; e Salmo 105:42; e os usos de dabar como verbo, com o mesmo significado de “prometer”, em Deuteronômio 1:11; 6:3, 9:28; Josué 9:21; 22:4; 23:5.
Ellen G. White confirma nossa interpretação com a seguinte declaração sobre a função do Decálogo: “Os Dez Dandamentos [...] são dez promessas.” (Manuscrito 41, 1896 [publicado no Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, v. 1, p. 1105]. “Em toda ordem ou mandamento dado por Deus, há uma promessa, a mais assertiva, fundamentando-a” (Ellen G. White, O Maior Discurso de Cristo [CPB, 2022], p. 54). Ela enfatiza que “a voz de Deus do céu” fala “à alma em promessa:
Faça isso, e você não ficará sob o domínio e controle de Satanás” (Carta 89, 1898 [publicado em Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, v. 1, p. 1105]).
As aparentes restrições da lei são apenas para o nosso bem, a fim de manter a felicidade e a vida (Mq 6:8; Jo 10:10). A lei é a norma de conduta para aqueles que confiam em Deus e são salvos por Sua graça por meio da fé em Cristo.
O lugar da lei na nova aliança é extraordinário – ela é gravada no coração. A lei é internalizada (veja Mt 5:21-48) e deve ser encarada não como um fardo, mas como uma fonte de alegria. Aqueles que vivem o Decálogo corretamente seguem suas promessas com motivos corretos, obedecendo seus preceitos em reconhecimento e gratidão pelo que Deus fez e está fazendo por eles. A graça não muda a lei, mas nossa atitude em relação a ela muda. Paulo é contra o legalismo e contra o uso indevido da lei de Deus, mas não contra a lei em si (Rm 7:9-12).
Jesus Cristo é o telos da lei (Rm 10:4), e isso significa que Ele é seu objetivo e propósito, não o fim no sentido de término ou cessação de sua validade. Cristo é a chave hermenêutica que desbloqueia o verdadeiro significado e propósito da lei. Assim, seria incorreto afirmar que Cristo invalidou, encerrou, substituiu ou revogou a lei. Cristo dá significado à lei.
Como Josué lembrou ao seu público, não somos capazes de obedecer a Deus: “Vocês não poderão servir o Senhor” (Js 24:19). No entanto, quando pedimos a Deus para tomar nossa fraqueza, Ele nos tornará fortes. Ele nos dará Seu Espírito Santo, que nos moverá a obedecê-Lo (Ez 36:27). Paulo diz: “Quando sou fraco, então é que sou forte” (2Co 12:10). A obediência é a obra do Espírito Santo em nós.
APLICAÇÃO PARA A VIDA
Faça as seguintes perguntas aos alunos:
1. Como seres humanos, só conseguimos decidir fazer o que é certo sob a influência da graça de Deus. Precisamos escolher obedecê-Lo, mas não temos a força para cumprir essa decisão ou segui-Lo. Em nossa fragilidade e fraqueza, precisamos de ajuda externa. A boa notícia é que Ele nos oferece tanto a disposição (como resposta ao Seu chamado de amor) quanto o poder para obedecer (Fp 2:13). De maneira prática, como você percebe essas provisões atuando em sua própria vida?
2. Tudo o que Deus ordena, Ele capacita Seus seguidores a realizar. Ellen G. White afirma que “todas as Suas ordens são promessas habilitadoras” (Parábolas de Jesus [CPB, 2022], p. 192). Sob essa perspectiva, os Dez Mandamentos podem ser vistos como dez bem-aventuranças. De que maneira os mandamentos de Deus podem capacitar os crentes a obedecer a Ele?
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Ouvindo Deus, odiando o pecado
Namíbia | Uapahurua
Nas profundezas do deserto da Namíbia, vive um povo que mantém o estilo de vida há centenas de anos. O povo Himba é seminômade, deslocando-se com rebanhos de gado e cabras de poço em poço para garantir que tenham água suficiente durante os longos e quentes meses da estação seca. Durante a curta estação chuvosa, as famílias retornam aos seus assentamentos de três ou quatro cabanas, chamadas de aldeias, para cultivar milho para sustentá-las pelo resto do ano.
Uapahurua está entre os poucos himbas que foram batizados e se juntaram à Igreja Adventista do Sétimo Dia. Ele ouviu falar de Deus pela primeira vez por meio de um programa evangelístico iniciado por uma oferta trimestral em 1993. Esta é a história dele.
Uapahurua era um típico adolescente himba. Ele roubava, brigava e bebia. As três atividades muitas vezes estavam interligadas.
Na criação de cabras, gado e milho, o povo himba é autossustentável e raramente precisa de dinheiro para alguma coisa. Mas um fluxo de dinheiro entra na comunidade himba uma vez por mês, quando os idosos recebem os pagamentos de pensão do governo da Namíbia. Quando o dinheiro chega, os adolescentes vão até os avós para pedir dinheiro para comprar bebidas alcoólicas. Os pequenos empreendedores sabem que o dinheiro da pensão chegou e se reúnem perto das aldeias himbas para vender álcool.
À medida que as pessoas começam a beber, as brigas inevitavelmente começam. Uapahurua uma vez viu um adolescente bêbado empurrar outro e gritar: "Saia do caminho. Eu quero ultrapassar você". O adolescente que foi empurrado revidou. Outros adolescentes se juntaram, e uma briga de facas começou.
Quando o dinheiro da pensão não está disponível, alguns adolescentes recorrem ao roubo.
Uapahurua se lembra de encontrar vários jovens esfolando uma vaca no mato. Ele lhes perguntou: "De quem é esta vaca?" "É nossa", respondeu um jovem. "A vaca morreu sozinha", acrescentou outro.
Uapahurua deu uma olhada mais de perto na vaca. As famílias himbas identificam suas vacas por marcas especiais de faca nas orelhas. A vaca morta tinha marcas de faca recém-feitas em suas orelhas.
Um julgamento conduzido pelos líderes himbas descobriu que os jovens haviam roubado a vaca e planejavam vender sua carne para comprar álcool. Os jovens foram condenados a reembolsar o dono da vaca.
Roubar, brigar e beber era um estilo de vida familiar para Uapahurua quando um pastor adventista do sétimo dia apareceu em sua cabana. O pastor estava alcançando o povo himba sob uma iniciativa parcialmente financiada por uma oferta trimestral de 1993.
O pastor falou sobre Deus. Uapahurua nunca tinha ouvido falar de Deus e estava curioso para saber mais.
Naquele sábado, ele foi a um culto de adoração que o pastor realizava debaixo de uma árvore próxima. Como muitas pessoas himbas, ele nunca tinha ido à escola e não conseguia ler a Bíblia sozinho. Então, ele ouvia enquanto o pastor lia a Bíblia. Ele ouviu pela primeira vez sobre o Deus que criou o mundo e tudo o que nele existe, incluindo milho, cabras, vacas e o povo himba.
Com o passar das semanas, ele se convenceu de que não estava vivendo corretamente.
O pastor não conseguia fazer a reunião debaixo da árvore todos os sábados. Então Uapahurua começou a ir à Igreja Adventista na cidade mais próxima nesses sábados. Ele se levantava cedo na manhã de sábado para a caminhada de sete horas até a cidade.
Ao ouvir a Bíblia, ele começou a odiar roubar. Ele começou a odiar brigas. Ele começou a odiar beber. Ele não conseguia entender o que estava acontecendo. Ele não conseguia indicar uma passagem específica da Bíblia que tocasse seu coração. Ele só sabia que, ao ouvir a Palavra de Deus, começou a odiar coisas pecaminosas. Ele se arrependeu de seus pecados e foi batizado. Ele tinha 23 anos quando entregou seu coração a Deus. Hoje, ele tem 46 anos.
Não tem sido um caminho fácil. As tentações de voltar à sua antiga vida são muitas. "É difícil ser cristão", disse ele. "É difícil não roubar, brigar e beber. Isso faz parte da nossa vida diária aqui."
Uma oferta trimestral de 1993 ajudou a financiar um programa de evangelismo para o povo himba que resultou na visita do pastor à casa de Uapahurua. Assim como a bênção dessa oferta ainda está sendo sentida na família e na comunidade de Uapahurua, sua contribuição para os projetos deste trimestre também pode, com a bênção de Deus, ter um impacto duradouro na Namíbia e em outros lugares. Obrigado por sua oferta do dia 27 de setembro.
Por Andrew McChesney
Dicas para a história
• Mostrar a Namíbia no mapa. Indique a cidade de Opuwo, ao norte, onde fica o prédio da Igreja Adventista mais próximo da propriedade de Uapahurua.
• Assista a um curto vídeo no YouTube de Uapahurua e sua esposa: bit.ly/Uapahurua-SID.
• Saiba que duas ofertas anteriores do trimestre, em 1993 e 2012, foram para espalhar o evangelho ao povo himba, que conta com cerca de 50.000 indivíduos. Parte da oferta de 2012 foi usada para distribuir MP3 players contendo a Bíblia para eles. Dois dos projetos deste trimestre também incluem a Namíbia: um projeto para distribuir Bíblias dos Aventureiros para crianças carentes e um projeto para produzir uma série de curtas-metragens sobre o fruto do Espírito.
• Baixe fotos para esta história no Facebook: bit.ly/fb-mq.
• Compartilhe as postagens do Informativo Mundial das Missões e fatos rápidos da Divisão Africana do Sul e do Oceano Índico: bit.ly/sid-2025.
Comentário da Lição da Escola Sabatina – 3º trimestre de 2025
Tema geral: “O livro de Êxodo”
Lição 8 – 16 a 22 de agosto
Aliança no Sinai
Autor: Felipe Alves Masotti
Editor: Fernando Dias de Souza
Revisora: Esther Fernandes
O estudo desta semana aborda Êxodo 19 e 20. Esses capítulos são centrais no livro de Êxodo, pois apresentam a aproximação do povo ao ideal de Deus. Neles, o conceito de aliança é detalhado. O termo hebraico berit (aliança, pacto, concerto, testamento) é utilizado no Antigo Testamento para indicar a formação de um contrato com força relacional.
Textos do Antigo Oriente Médio ajudam-nos a entender que a aliança entre Deus e Israel foi ratificada conforme um padrão de comunicação estabelecido na antiguidade. Esses documentos revelam fórmulas e rituais próprios da ratificação de acordos. Em particular, destaca-se o modelo de tratado entre suserano e vassalo. Essa forma de relação pactual pressupunha a fidelidade de uma parte menor (o vassalo) a um rei maior (o suserano).
A aliança entre Deus e Seu povo contém linguagem claramente indicativa desse tipo de tratado. O cerne da aliança encontra-se em Êxodo 19:3 a 6. O verso 4 apresenta Deus como uma águia que conduz os israelitas para Si. A ação libertadora precede o convite divino ao pacto. Ou seja, Deus primeiro liberta, depois convida para o relacionamento e propõe as estipulações da aliança.
Os versos 5 e 6 estão repletos de pronomes possessivos na primeira pessoa. Deus diz: “Se ouvirem atentamente a Minha voz e guardarem a Minha aliança, vocês serão a Minha propriedade peculiar dentre todos os povos. Porque toda a terra que é Minha, e vocês serão para Mim um reino de sacerdotes e uma nação santa.” O zelo divino é enfatizado com essa linguagem. O termo hebraico segullâ (“propriedade peculiar”) geralmente indica o direito inalienável de posse, seja de terras ou de bens (Ec 2:8; 1Cr 29:3). Deus propõe que Israel seja sua propriedade exclusiva entre os povos, com um objetivo claro: ser um povo sacerdotal.
Israel, povo sacerdotal
A vocação sacerdotal de Israel entre as nações é um dos principais fundamentos da escolha divina. A ideia ecoa a promessa feita a Abraão de que nele seriam benditas todas as famílias da Terra (Gn 12:3). O foco da aliança do Sinai é, portanto, o modo como o relacionamento divino-humano prometido a Abraão e à sua descendência deve ser vivido e mantido (Gn 17:7, 8).
A santidade e o caráter exclusivo de Israel estão intrinsecamente ligados ao seu relacionamento com Deus. A terra inteira pertence ao Senhor, e a escolha de Israel se dá justamente por causa desse domínio universal. Isso indica que os descendentes de Abraão foram escolhidos para ser “luz para os gentios” (Is 42:6; 49:6; 60:3). A guarda da lei, portanto, não é apenas uma exigência moral ou religiosa, mas uma expressão da fidelidade ao plano revelado de Deus para a humanidade. Assim como o Senhor Se revelou ao Egito por meio da libertação de Israel, Ele deseja revelar-Se ainda mais na vivência pactual de Seu povo. Cumprindo suas obrigações, Israel revelaria o Senhor às nações.
O Sinai e o Decálogo
Êxodo 19:9 a 25 descreve detalhadamente os procedimentos de purificação para que o povo se apresente diante de Deus. O verso 9 inicia com uma atitude significativa: Deus deseja validar publicamente a liderança de Moisés, falando com ele audivelmente diante da nação. A resposta do povo confirma sua disposição em obedecer (Êx 19:7, 8). Em seguida, o Senhor ordenou três dias de preparação e purificação, ao fim dos quais desceria sobre o monte Sinai “à vista de todo o povo” (Êx 19:10, 11). Essa afirmação aponta para uma experiência espiritual profunda: o povo teria percepção vívida da presença de Deus. Uma manifestação de Deus que pode ser percebida pelos sentidos humanos é chamada de teofania.
A teofania do Sinai antecipa a futura estrutura do santuário (Êx 19:16-19). O monte é delimitado (Êx 19:12, 13), o acesso é seletivo (Êx 19:24) e as manifestações sensoriais — nuvem, trovões, som de trombeta — evocam o culto e a adoração formal que viriam adiante. Assim, o povo está diante do Senhor para receber a constituição espiritual da nação. A lei é apresentada como um presente gracioso de Deus a um povo redimido, que aceita livremente entrar em aliança com Ele.
As Dez Palavras e a natureza da lei
Êxodo 20 é um dos capítulos centrais da Bíblia. Nele estão as chamadas “Dez Palavras”, os princípios fundamentais que regem o relacionamento entre Israel e Deus, e os membros da comunidade. É importante entender que, no mundo antigo, especialmente no Oriente Médio, leis não funcionavam como estatutos modernos. O sistema jurídico greco-romano, que influencia o Direito até hoje, normatiza ações externas (por exemplo, matar alguém). Já a lei bíblica trabalha de dentro para fora, regulando intenções e moldando o coração.
Jesus reafirmou essa abordagem interior no Sermão do Monte (Mt 5:21-48). Ele criticou a interpretação legalista dominante no farisaísmo, que havia sido influenciada por um raciocínio jurídico externo e punitivo. Ele mostrou que a essência da lei está nas motivações internas. O Antigo Testamento também prenuncia essa interiorização da lei, ao afirmar que a lei será escrita no coração do povo (Jr 31:33).
“Darei a vocês pastores segundo o Meu coração, que os apascentem com conhecimento e com inteligência. E […] nunca mais se exclamará: ‘A arca da aliança do SENHOR!’ […] Naquele tempo, chamarão Jerusalém de ‘Trono do SENHOR’. Nela se reunirão todas as nações em nome do SENHOR e já não andarão segundo a dureza do seu coração maligno” (Jr 3:15-17). Esse texto prevê um tempo em que a presença de Deus substituirá os símbolos, e a lei será vivida no coração, não apenas registrada em tábuas ou artefatos sagrados. Portanto, a oposição entre Antigo e Novo Testamento, no que tange à lei, é um anacronismo. Desde o princípio, a lei foi um meio para moldar o coração do povo. E, como ensinaram os autores do Novo Testamento, ela revela o caráter do Legislador, um caráter libertador e redentor.
Seja como espelho, pedagogo ou precursor de Cristo, a lei foi o primeiro presente que Deus concedeu a um povo livre, sinalizando uma libertação ainda maior: a libertação do pecado e da alienação espiritual. Por meio da obediência à aliança, Israel não apenas vivia em comunhão com Deus, mas também manifestava Sua presença ao mundo.
Referências:
Richard M. Davidson, A Song for the Sanctuary: Experiencing God’s Presence in Shadow and Reality (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 2022).
Jacques B. Doukhan, Richard M. Davidson, Genesis and Exodus. Seventh-day Adventist International Biblical Commentary, v. 1 (Nampa, ID: Pacific Press, 2025).
Michael G. Hasel, “Êxodo”, em Ángel Manoel Rodríguez (editor-geral), Comentário Bíblico Andrews (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2024), v. 1.
Nahum M. Sarna, Exodus: The Traditional Hebrew Text with the New Jewish Publication Society Translation (Philadelphia, PA: Jewish Publication Society, 1991).
Ellen G. White, Patriarcas e Profetas (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2022).
Conheça o autor dos comentários deste trimestre: Felipe Alves Masotti é pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Formou-se em Teologia no Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp) em 2008, atuando posteriormente como capelão do Colégio Curitibano Adventista Bom Retiro e pastor de jovens na Igreja Adventista do Sétimo Dia Central de Curitiba. É mestre em Interpretação Bíblica pelo Unasp e doutor em Teologia do Antigo Testamento pela Universidade Andrews. Desde 2020, é professor de Antigo Testamento no Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia (SALT), no campus da Faculdade Adventista do Paraná (FAP). Felipe é autor, coeditor e coautor de várias obras, incluindo Daniel: Interpretação, História e Teologia (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2024), But the Wise Shall Understand (Tübingen: Mohr Siebeck, 2025) e Exploring the Composition of the Pentateuch (University Park, PA: Eisenbrauns, 2020). É casado com Camila Masotti, também professora na FAP, e pai de M